Este artigo, é a segunda parte sobre Fator de Potência, aqui abordaremos sobre a Legislação na Distribuição de Energia elétrica, o cálculo para obter o fator de potência atual de sua instalação e as correções cabíveis para mitigar problemas com o fornecimento.

Com o advento das Leis de Faraday e de Lenz, o sucesso dos projetos de transmissão de energia em corrente alternada e o uso difundido desta técnica para as mais diversas tarefas tornavam-se inevitáveis.

Motores, refrigeradores, transformadores, fornos a arco, reatores e eletrodomésticos em geral (equipamentos basicamente construídos a partir de indutores) foram responsáveis pela reinvenção da indústria e pelo requinte no conforto das residências.
Porém, o uso maciço destes equipamentos começou a ser causa de preocupação: uma considerável parcela da energia consumida por estes equipamentos destina-se pura e simplesmente à magnetização do núcleo Ferro-Magnético. Começavam-se os primeiros relatos sobre Fator de Potência (FP).

1. Ângulo de Defasagem

Um Resistor tem funcionamento semelhante em corrente contínua e alternada. A forma de onda da corrente passante por ele tem a mesma forma da onda de tensão, independente da freqüência ou do tipo de onda.

fator de potência circuito resistivo

Figura 1: Exemplo de Circuito Resistivo. A forma de onda da tensão é idêntica e em fase com a forma de onda de corrente.

 

Como já observado, elementos armazenadores de energia (capacitores e indutores) não mantêm iguais formas de onda de tensão e corrente.
Os indutores, devido à necessidade de energia para a criação do campo magnético circulante no núcleo, atrasam a corrente em relação a tensão, a exemplo dos capacitores, que atrasam a tensão em relação a corrente, na necessidade da criação do campo elétrico variável.

fator de potência circuito capacitivo

Figura 2: Exemplo de Circuito puramente Capacitivo. A forma de onda de corrente se encontra adiantada 90° (ocorre 90° antes) em relação à forma de onda da tensão.

 

fator de potência circuito indutivo

Figura 3: Exemplo de Circuito puramente Indutivo. A forma de onda de corrente se encontra atrasada 90° (ocorre 90° depois) em relação à forma de onda da tensão.

Define-se Ângulo de Defasagem (θ) o ângulo de diferença de fase entre tensão e corrente. No caso do Circuito:
Resistivo (Figura 1): θ = 0°;
Capacitvo (Figura 2): θ = -90°;
Indutivo (Figura 3): θ = 90°.

Vale ressaltar aqui que capacitores e indutores, nas suas estruturas elementares, não realizam nenhum tipo de trabalho: a corrente consumida por eles é apenas utilizada para criação dos campos elétrico e magnético, respectivamente.

2. Fator de Potência

Em Corrente Alternada perfeitamente senoidal, define-se Fator de Potência como sendo o cosseno do ângulo de defasagem entre tensão e corrente.

fator de potência fórmula fator de potência

Equação 1

Assim, para o Circuito:

  • Resistivo (Figura 1): FP = cos(0°) = 1 (transformação de toda a energia consumida em trabalho, no caso, calor);
  • Capacitvo (Figura 2): FP = cos(-90°) = 0 (energia consumida não convertida em trabalho);
  • Indutivo (Figura 3): FP = cos(90°) = 0 (energia consumida não convertida em trabalho).

O Fator de Potência é uma ferramenta muito útil para saber qual parcela da potência consumida está de fato realizando algum tipo de trabalho. Neste conceito, cabe a definição de mais três grandezas:

  • Potência Aparente (S): Potência Total consumida, dada em VA (Volt-Ampére);
  • Potência Ativa (P): Potência que efetivamente realiza trabalho, dada em W (Watts);
  • Potência Reativa (Q): Potência responsável pela criação dos Campos Magnéticos e/ou Elétricos, dada em VAr (Volt-Ampére Reativo).

Essas diferentes modalidades de Potência estão relacionadas entre si pelo Triângulo de Potências, que é organizado no plano mostrado abaixo:

fator de potência triângulo de potências

Figura 4: Plano de disposição do Triângulo de Potências. As componentes reativas resultantes da atuação de indutores devem ser dispostas no eixo vertical superior enquanto que componentes reativas resultantes da atuação de capacitores devem ser dispostos no eixo vertical inferior. As componentes ativas, realizadores de algum tipo de trabalho, devem ser dispostas no eixo horizontal.

Exemplificando como dispor as Potências no plano descrito e estabelecer o Triângulo de Potências, considere o circuito da figura 32.

A partir de cálculos específicos, obteve-se os valores das potências dos três elementos do circuito, lembrando que indutores e capacitores têm apenas componentes reativos de Potência, e resistores têm apenas componentes Ativos.

circuito rlc

Figura 5: Circuito RLC.

 

  • QC (Potência Reativa resultante da ação do Capacitor) = 18959 VAr capacitivo;
  • QL (Potência Reativa resultante da ação do Indutor) = 26972 VAr indutivo;
  • PR (Potência Ativa resultante da ação do Resistor) = 7154 W;

Assim, temos a seguinte disposição no plano:

fator de potência correção fator de potência

Figura 6: Disposição das Potências Reativas e Ativa no plano. A Potência Reativa resultante é a diferença entres as Potências Reativas Indutiva e Capacitiva. Este é o princípio da Correção de Fator de Potência.

A Potência Aparente (Potência total consumida) é a soma vetorial entre Potência Ativa e Reativa, como descrito na figura 7.

fator de potência potência aparente

Figura 7: Obtenção da Potência Aparente.

Não coincidentemente, percebe-se que o ângulo entre a Potência Aparente e a Potência Ativa é exatamente igual ao ângulo de Defasagem entre a tensão da fonte e a corrente do circuito RLC (Figura 5). Portanto é fácil concluir que quanto mais próximo de 0° for o ângulo de defasagem, mais eficiente será a utilização da energia consumida e maior será o Fator de Potência do Circuito.
Para o exemplo em questão, temos que:

fator de potência fórmula fator de potência aplicada

3. Correção de Fator de Potência

A Correção do Fator de Potência consiste no acréscimo de elementos que produzirão Potência Reativa Contrária à Potência Reativa notada no Circuito em que se deseja efetuar a correção, até que se alcance o Fator de Potência desejado.
Vamos supor que queiramos elevar o fator de potência da carga da Figura 32 para 0,9. Sabe-se que a componente Reativa da carga é predominantemente Indutiva (ver Figura 33). Assim, será necessário acrescentar um Capacitor à carga de forma que ele produza energia reativa suficiente para diminuir o ângulo entre Potência Aparente e Ativa.
Considerando então o novo Fator de Potência, o ângulo de defasagem (θ) corrigido deverá ser:

fator de potência ângulo de defasagem

Pela definição trigonométrica de tangente, temos que:

fórmula tangente

Equação 2

Então,

fórmula tangente aplicada

fator de potência potência reativa correção

Este é o valor da nova Potência Reativa que a carga deverá assumir para que ela adquira Fator de Potência igual a 0,9. Desta forma devemos acrescentar, então, à carga um capacitor que produza uma energia Reativa igual a:

fator de potência cálculo capacitor correção

A partir de cálculos específicos, conclui-se que, para efetuar a correção, devemos instalar junto à carga um capacitor de 0,00075F.

C = 0,00075F = 0,75mF

fator de potência circuito carga corrigida

Figura 8: Circuito com carga Corrigida. O Fator de Potência subiu para 0,9, diminuindo o valor da corrente (compare com a Figura 5) e diminuindo o ângulo de defasagem entre tensão e corrente.

Pelo Teorema de Pitágoras, pode-se determinar o valor da Potência aparente (Potência Total Consumida):

fator de potência triângulo de potência corrigido

Figura 9: Novo Triângulo de Potência, com a carga Corrigida. É evidente a diminuição da Potência total consumida.

 

Pode-se dizer que a Energia Reativa necessária para Magnetização dos Enrolamentos do Indutor foi fornecida alternativamente pelo Capacitor de Correção e não mais pela fonte (no caso, concessionárias de energia), aliviando o alimentador desta corrente Reativa.
A esmagadora maioria dos aparelhos eletro-eletrônicos vendidos hoje no Brasil é de natureza indutiva e com fator de potência menor que 0,9 (na melhor das hipóteses, pois equipamentos, como alguns reatores eletrônicos, podem apresentar fator de potência abaixo de 0,5).
Em Síntese, as principais vantagens da Correção do Fator de Potencia com a inclusão de Bancos de Capacitores são:

  • Aumento da Eficiência Energética;
  • Melhoria da Tensão;
  • Aumento da Capacidade dos Equipamentos de Manobra;
  • Aumento da vida útil das instalações e equipamentos;
  • Redução do Efeito Joule;
  • Redução da Corrente Reativa na Rede Elétrica.

4. Fator de Potência: Regulamentação e Legislação Atual

Em conformidade com o estabelecido pelo Decreto No 62.724 de 17 de maio de 1968 e com a nova redação dada pelo Decreto No 75.887 de 20 de junho de 1975, as concessionárias de energia elétrica adotaram, desde então, o fator de potência de 0,85 como referência para limitar o fornecimento de energia reativa.
O Decreto No 479, de 20 de março de 1992, reiterou a obrigatoriedade de se manter o fator de potência o mais próximo possível da unidade (1,00), tanto pelas concessionárias quanto pelos consumidores, recomendando, ainda, ao Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica – DNAEE – o estabelecimento de um novo limite de referência para o fator de potência indutivo e capacitivo, bem como a forma de avaliação e de critério de faturamento da energia reativa excedente a esse novo limite.

A nova legislação pertinente, estabelecida pelo DNAEE, introduziu uma nova forma de abordagem do ajuste pelo baixo fator de potência, com os seguintes aspectos relevantes:
– Aumento do limite mínimo do fator de potência de 0,85 para 0,92;
– Faturamento de energia reativa excedente;
– Redução do período de avaliação do fator de potência de mensal para horário, a partir de 1996 para consumidores com medição horosazonal.

Com isso muda-se o objetivo do faturamento: em vez de ser cobrado um ajuste por baixo fator de potência, como faziam até então, as concessionárias passam a faturar a quantidade de energia ativa que poderia ser transportada no espaço ocupado por esse consumo de reativo.

Este é o motivo de as tarifas aplicadas serem de demanda e consumo de ativos, inclusive ponta e fora de ponta para os consumidores enquadrados na tarifação horosazonal.
Além do novo limite e da nova forma de medição, outro ponto importante ficou definido: das 6h da manhã às 24h o fator de potência deve ser no mínimo 0,92 para a energia e demanda de potência reativa Indutiva fornecida (devido à predominância de cargas indutivas ligadas neste horário), e das 24h até às 6h no mínimo 0,92 para energia e demanda de potência reativa capacitiva recebida (devido ao desligamento de cargas indutivas e consequente predominância de cargas capacitivas).

A ocorrência de excedente reativo é verificada pela concessionária através do fator de potência mensal ou do fator de potência horário.
O fator de potência mensal é calculado com base nos valores mensais de energia ativa (“kWh”) e energia reativa (“kVArh”). O fator de potência horário é calculado com base nos valores de energia ativa (“kWh”) e de energia reativa (“kVArh”) medidos de hora em hora. Assim, sempre que o fator de potência de uma determinada instalação estiver abaixo de 0,92, a energia reativa consumida será faturada.
O aumento do fator de potência nas instalações consumidoras de energia traz vantagens às concessionárias como:

  • O Bloco de potência reativa deixa de circular no sistema de transmissão e distribuição;
  • Evita as perdas pelo efeito Joule;
  • Aumenta a capacidade do sistema de transmissão e distribuição para conduzir o bloco de potência ativa;
  • Aumenta a capacidade de geração com intuito de atender mais consumidores;
  • Diminui os custos de geração.

Causadores de baixo fator de potência em instalações elétricas são:

  • Motores de indução trabalhando a vazio;
  • Motores superdimensionados para sua necessidade de trabalho;
  • Transformadores trabalhando a vazio ou com pouca carga;
  • Reatores de baixo fator de potência no sistema de iluminação;
  • Fornos de indução ou a arco;
  • Máquinas de tratamento térmico;
  • Máquinas de Solda;
  • Nível de tensão acima do valor nominal provocando um aumento do consumo de energia reativa.

5. Fator de Potência Real

A melhor definição para Fator de Potência é:

fator de potência fator de potência real

Equação 3

Já que componentes reativos podem se caracterizar por fatores como distorções Harmônicas, e não somente por defasagem angular entre tensão e corrente. Para o último caso, a inclusão de Bancos de Capacitores são suficientes para aumento do fator de potência, porém, no caso de existir componentes harmônicos no sistema, cuidados extras devem ser tomados e, talvez, seja pertinente até a incorporação de filtros Harmônicos no sistema.

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6. Distorção Harmônica

Entende-se por distorção Harmônica a presença de ondas senoidais de maior freqüência que, somadas ao sinal fundamental (60Hz no caso do sistema elétrico brasileiro), fazem com que o sinal resultante tenha características bem diferentes de uma senóide.
Mesmo sabendo-se que os medidores instalados pelas concessionárias ainda* não estejam aptos a mensurar o fator de potência por distorção harmônica, é de vital importância entender a ação de componentes harmônicos na instalação.
As harmônicas têm origem na instalação de cargas não-lineares, cuja forma de onda de corrente não acompanha a forma de onda senoidal da tensão de alimentação. Nos transformadores de força, são consequência da relação não linear entre o fluxo de magnetização e a corrente de excitação correspondente.

São Cargas não-lineares (que distorcem a forma de onda da corrente e/ou tensão):

  • Conversores e inversores de frequência;
  • Acionamentos de corrente contínua;
  • Retificadores;
  • Fornos a arco e indução;
  • Transformadores com núcleo saturado;
  • No-Breaks (UPS);

* Já existem propostas no sentido de avaliar o Fator de Potência dos consumidores levando em consideração a distorção harmônica oriunda de sua instalação elétrica.

  • Controladores tiristorizados;
  • Fontes Chaveadas;
  • Máquinas de solda Elétrica;
  • Lâmpadas Fluorescentes com reatores eletrônicos;
  • Microcomputadores (Centro de processamento de dados);
fator de potência distorção harmônica

Figura 9: Exemplo de funcionamento de um retificador monofásico de onda completa. A tensão da fonte está em azul, perfeitamente senoidal. A tensão, após a retificação está em roxo, praticamente contínua, e, a corrente na fonte está em vermelho, totalmente distorcida. Esta distorção percorre o sistema elétrico causando vários problemas a concessionárias e consumidores.

Correntes harmônicas circulando na rede podem causar:

  • Aceleração da fadiga dos motores e isolações de fios e cabos devido ao aumento de tensão na rede, o que pode ocasionar queimas, falhas e desligamentos;
  • Aumento das perdas nos estatores e rotores de máquinas rotativas, causando superaquecimento danoso as máquinas;
  • Aumento das perdas Joule devido ao aumento do valor RMS da corrente, além do surgimento de quedas de tensão harmônicas nas várias impedâncias do circuito;
  • Distorção das Características de atuação de relés de proteção;
  • Aumento do erro em instrumentos de medição de energia, que estão calibrados para medir ondas senoidais puras;
  • Interferência em equipamentos de comunicação, aquecimento em reatores de lâmpadas fluorescentes, interferência na operação de computadores e em equipamentos para variação de velocidade de motores, etc;
  • Aparecimento de ressonâncias entre capacitores para correção de fator de potência e o restante do sistema, causando sobretensões e sobrecorrentes que podem causar sérios danos ao sistema;
  • Aumento excessivo da corrente no condutor neutro.

O Fator de Potência Real leva em consideração, além da defasagem entre tensão e corrente, a Taxa de Distorção Harmônica (THD) de corrente.

taxa de distorção harmônica

Equação 4

fórmula FP triangular

Equação 5

Alguns especialistas promovem o modelo em paralelepípedo de disposição de potências, e não triangular, como estudado no tópico. Este modelo incluiria a potência Reativa causada por distorções harmônicas.

FP paralelepípedo

Figura 10: Paralelepípedo de Potências. Modelo que retrata bem o Fator de Potência em ambientes não senoidais.